quarta-feira, 9 de julho de 2014

Meu Querido Avô João,

Há 21 anos que recebi aquele maldito telefonema. Era uma miúda. Quando a minha mãe me disse, do outro lado da linha, num pranto inconsolável, que tinhas partido, desatei aos gritos que não! Não era possível terem-te roubado de nós, assim. De forma tão cruel. Estavas internado, era um facto, mas entraste pelo teu próprio pé e não tornaste a sair. Nunca julguei ninguém, apenas aceitei que tinha chegado a tua hora de partires. Mas todos os dias, nos fazes muita falta. Ensinaste-me tanto. Os valores mais nobres aprendi-os contigo, com o teu exemplo e o teu ser magnífico. A lealdade, a fidelidade, o Amor, o colocares a família sempre acima de qualquer outra coisa. Sei que nesse dia o nosso mundo ficou muito mais pobre, mas o da minha mãe ficou ainda pior. Tenho absoluta certeza de que foi a sua maior perda. Eras tudo para ela. O pai amigo, cúmplice de quem era inseparável. A relação dela com a avó, tu sabes que era diferente. O facto de ter de abdicar da infância por ser a mais velha, criou entre elas algumas mágoas. Mas o tempo levou tudo e deixou somente o Amor. O Amor puro de quem ama com o coração todo, e da forma mais pura.
Sei que estás num lugar a que chamam paraíso. Sei que olhas por todos nós. Nos proteges e nos guardas daquela forma como só tu sabes. Como só tu sabes zelar pela família.
Temos milhões de saudades. Mas sabes? O Amor que nos une jamais morrerá. É ele que perpetua a tua existência em nós. O teu sorriso, a tua imagem encostada na ombreira da porta da cozinha, fazendo sempre questão e tanto gosto em ver-nos comer. Quando me davas a comer os carapaus fritos, frios, no dia seguinte a meio da manhã, quando o calor já era abrasador. Quando me deixavas um golinho de cerveja no fim da garrafa, porque sabias que eu adorava. Hoje não aprecio tanto, mas continuo a adorar os carapaus fritos frios, que associo imediatamente a ti.
Eras uma delicia de avô. Mesmo quando não me deixavas ir sair à noite lá no Alentejo, para me juntar aos amigos no Poço ou na Escola. Não querias que falassem de mim, justificavas. Bem sabias como as velhotas nas aldeias eram coscuvilheiras. Querias proteger-me, eu sei. E que bem que o fizeste. Espero nunca ter-te desiludido, mesmo nos momentos em que não entendia como me podias proibir de fazer certas coisas ou ir a certos sítios.
Sabes, um dia falarei de ti aos meus filhos. Ensinar-lhe-eis os valores que sempre me transmitiste. E é graças a ti que considero que os avós são tão importantes na vida dos netos. Tal como a avó a quem devo tanto. Acima de tudo, devo-vos o mimo que sempre me deram em doses industriais. As vontades que me faziam e a paciência do tamanho do mundo para quando comer era perfeitamente dispensável para mim, ainda que o meu corpo revelasse tão somente pele e osso.
Agradeço-vos tanto. Agradeço-vos tudo. Tudo aquilo que nunca serei capaz de retribuir, a não ser no grande amor que por vocês eu sinto.
Jamais o tempo levará este amor que nos une. A essência do nosso amor puro.
Obrigada outra vez, por me ensinarem o que é ser nobre em valores e em sentimentos.
Obrigada.

Amo-vos. Todos os dias. Como antes. Como Sempre.
Sinto muito a vossa falta, todos os dias sem excepção.

Sem comentários:

Enviar um comentário